• Crise dos Caminhoneiros escancara dependência rodoviária e descaso com transporte hidroviário no Brasil.

    Especialista em logística aponta que concentração no modal rodoviário favorece arrecadação de impostos sobre combustíveis e limita alternativas logísticas no país

    A paralisação nacional dos caminhoneiros deixou um rastro de reflexões que ultrapassam o caos imediato do desabastecimento. Para empresários, o episódio serviu como alerta para melhorias nas condições de trabalho da categoria. Já para o cenário político, a greve evidenciou a força estratégica dos caminhoneiros na dinâmica socioeconômica do país — afinal, o Brasil literalmente parou.

    Contudo, um aspecto menos discutido permanece à margem dos noticiários: a profunda dependência do transporte rodoviário como principal meio de escoamento da produção nacional.

    ULTRAGAZ CURURUPU
    ULTRAGAZ CURURUPU

    Segundo dados da Fundação Dom Cabral, cerca de 75% de tudo o que é produzido no Brasil é transportado por caminhões. Em contrapartida, o transporte hidroviário, mesmo com o país possuindo 42 mil quilômetros de rios navegáveis, representa míseros 0,7% da matriz logística nacional. O transporte marítimo responde por 9,4%, o aéreo por 5,8%, o ferroviário por 5,4%, e a cabotagem por 3%.

    Transporte hidroviário: econômico, sustentável e negligenciado

    A lógica é simples: transportar uma tonelada de mercadoria por 1.000 km custa, em média, 4,1 litros de combustível no navio, contra 15,4 litros no caminhão. Mesmo sendo três vezes mais barato, o transporte aquaviário é historicamente ignorado pelas políticas públicas.

    Sinspumuc
    Sinspumuc

    A razão? Interesses econômicos e políticos, afirma Fabrício Santos, gestor de oferta logística na Máxima Sistemas.

    “O único interesse do poder público parece ser manter o país dependente das rodovias — e, consequentemente, do consumo de combustível, o que garante maior arrecadação de impostos”, analisa.

    Além disso, segundo ele, obras viárias têm maior apelo político e visibilidade: “É mais fácil mostrar uma estrada duplicada do que explicar os benefícios de uma hidrovia eficiente”.

    Integração logística como caminho viável, mas ignorado

    Embora o Brasil tenha potencial para diversificar seus modais, pouco ou nada é feito para integrar sistemas ferroviário, hidroviário e dutoviário. Essa inércia compromete a segurança logística do país, como ficou evidente durante a greve dos caminhoneiros, quando milhares de empresas viram suas cadeias de suprimento colapsarem.

    Para o setor atacadista e distribuidor, que depende diretamente da fluidez logística, a adoção de tecnologias móveis surge como alternativa emergencial. Monitoramento em tempo real das entregas, controle de rotas e rastreamento da mercadoria são medidas que podem mitigar impactos em cenários de paralisação.

    Prevenir ainda é o melhor remédio

    A greve foi mais do que um protesto — foi um alerta sobre o desequilíbrio logístico e sobre a omissão histórica dos governos diante de modais mais eficientes. Enquanto não houver vontade política para mudar esse cenário, a dependência rodoviária continuará sendo um ponto frágil da economia brasileira.

    “Nunca se sabe quando haverá a próxima greve. E por isso, planejar e diversificar são as melhores estratégias”, finaliza Fabrício Santos.

    Deixe uma resposta